quinta-feira, 13 de julho de 2017

O ESPANTO DA NAÇÃO

*Artigo publicado originalmente na Revista Republicana, n.40, junho/2017, ISSN 2526-8929

A história da administração pública no Brasil teve início com o patriarcalismo colonial, que evoluiu para o coronelismo da República. Mas a partir do momento em que chefes políticos foram perdendo a capacidade de controlar os votos, passaram a utilizar a formulação de políticas públicas como meios legais de controle de clientela. [1] A troca política, portanto, enraizou-se entre a “ordem humana e a aspiração ao poder”.[2]

É certo que as políticas públicas refletem o contexto sócio-político-econômico do país, Estados e seus Municípios, seguem ditames da Carta Magna, da legislação infraconstitucional, da legislação fiscal, são implementadas por agentes políticos e servidores públicos, sofrem influências do segundo e do terceiro setor.

Mas também se originam nas ideologias e interesses dos partidos políticos poderosos, que por vezes, definem a formulação de políticas públicas de modo a fidelizar o voto do eleitor e perpetuar sua manutenção no poder político. Esta é a dimensão da máquina política, colocada em movimento num sistema de recompensas. Neste contexto, a administração pública contaminada pelo clientelismo pode assumir versão tradicional, “caracterizado por um forte conteúdo personalista” de trocas privadas ou ser direcionado ao atendimento de demandas difusas de determinado eleitorado, mobilizado por motivações ideológicas, econômicas e/ou regionais.[3]

A questão se aprofunda na análise sóciodemográfica de redutos eleitorais. Em locais mais carentes, eleitores tendem a preferir benefícios individualizados às suas necessidades prementes. Já em locais mais abastados, eleitores ficam satisfeitos com bens públicos universalistas, como calçamentos, infraestrutura, pois a renda pessoal que lhes garante a satisfação de necessidades básicas[4].

O binômio necessidade-oportunidade parece lógico deste ponto de vista, mas trata-se de uma análise parcial do cenário de trocas político-eleitorais descortinado no Brasil. O que se observa não é apenas o clientelismo eleitoral, como se pensava, mas sim, a utilização de grandes grupos corporativos para custear campanhas e mandatos em troca de favorecimentos empresariais.

Temos hoje, no Brasil, discussão aberta sobre corrupção. E cada nova situação descrita, que traz a público métodos requintados e complexos de corrupção, novas regras legais são criadas para limitar as trocas eleitorais, senão pela legislação, mas pelo próprio Poder Judiciário. Estas regras, contudo, contribuirão para coibir a corrupção, mas não eliminá-la.
O espanto da nação é justificado e se dá em razão da audácia nas cifras e do aspecto corriqueiro da corrupção político-empresarial. Mas a cura deste mal está no voto, instrumento da democracia. O espanto é importante, a indignação é medicinal, mas o futuro é escolha do cidadão. No momento do voto, que se aproxima, é importante repensar partidos e candidatos, analisar o passado para repaginar o futuro, pois “o erro acontece de vários modos, enquanto ser correto é possível apenas de um modo”.[5]




[1] FERNANDES, W. A força do clientelismo. João Pessoa: Universitária, 2006.222p.
[2] BAHIA, L. H. N. O poder do clientelismo: raízes e fundamentos da troca política. Rio de Janeiro: 2003.374p.
[3] DINIZ, E. Voto e máquina política: patronagem e clientelismo no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982.228p.
[4] BORGES, A. Federalismo, dinâmica eleitoral e políticas públicas no Brasil. Sociologias, Porto Alegre, ano 12, n.24, p. 120-157, maio/ago.2010.
[5] ARISTÓTELES, Ética a Nicômaco. Tradução: Edson Bini. São Paulo: Edipro. 2002.287p.